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5 de junho de 2018

Prefeitura de São Paulo quer estimular deslocamentos a pé, mas a cidade é amigável?

Prefeitura de São Paulo quer estimular deslocamentos a pé, mas a cidade é amigável?

Não basta estimular o andar a pé se as calçadas são ruins, as travessias perigosas, e o entorno recheado de problemas que colocam em risco a vida das pessoas

Alexandre Pelegi

O Estatuto do Pedestre, sancionado no dia 13 de junho pelo prefeito João Doria, já começa a surtir efeito.

O secretário municipal de Transportes e Mobilidade Sérgio Avelleda promete não só medidas como a ampliação do tempo semafórico em várias travessias da cidade, como já prepara uma novidade que poderá servir como estímulo a quem queira caminhar por São Paulo. A intenção da prefeitura é espalhar placas pelas ruas informando o tempo de deslocamento e a distância a pé entre pontos da capital. Uma maneira de estimular as pessoas a caminharem ao invés de usar modos de transporte motorizado.

Avelleda tem repetido nos últimos tempos que a mobilidade a pé é uma das principais prioridades de sua gestão. Uma das medidas já adotadas em prol do pedestre, segundo ele, foi a ampliação do tempo de travessia em oito avenidas de grande circulação.

Os dados da Prefeitura de São Paulo, no entanto, mostram que a batalha para melhorar a vida dos pedestres não será nada fácil. Em 2016, 343 pedestres morreram na cidade, vítimas do trânsito nada amigável. O detalhe é que a maioria é formada por pessoas mais idosas, com mais de 50 anos.

Conforme anunciamos em junho deste ano, os idosos são um alvo fácil no trânsito de São Paulo. O relatório anual de acidentes de trânsito de 2016, divulgado pela CET (Companhia de Engenharia de Trânsito), apontou números preocupantes: uma em cada três pessoas mortas por atropelamento tinha 60 anos ou mais. Relembre:

https://diariodotransporte.com.br/2017/06/13/idosos-representam-13-das-mortes-por-atropelamento-em-sao-paulo/

O fato das vítimas serem idosas não é uma coincidência. Uma pesquisa da Faculdade de Saúde Pública da USP mostrou recentemente que a velocidade de travessia de pedestres utilizada para definir o tempo semafórico na capital é rápida demais para as pessoas de mais idade. Relembre:

https://diariodotransporte.com.br/2017/05/04/semaforos-de-sp-penalizam-populacao-idosa/

O que se questiona é se o tempo semafórico está sendo aumentando na proporção suficiente para aumentar a segurança das pessoas mais vulneráveis, onde se enquadram além dos idosos, as crianças, mulheres gestantes e pessoas com algum tipo de deficiência.

Mas antes disso, para caminhar é preciso não apenas que o trajeto não seja interrompido a todo instante por longas e perigosas travessias. É preciso muito mais que isso: que as calçadas sejam convidativas, planas e bem cuidadas, o que raramente se vê nas cidades brasileiras.

Afinal, não basta uma placa informando que o tempo de caminhada do Centro até a Rodoviária do Tietê é de cerca de 28 minutos se as calçadas são ruins, as travessias perigosas, e o entorno recheado de problemas que colocam em risco a vida das pessoas. Uma cidade que hostiliza seus moradores dificilmente conseguirá ser uma cidade onde o caminhar seja praticado pela maioria.

Outro ponto importante é a ausência de pontos de descanso, de locais com sombra. Enfim, cidades que se preocupam de fato com as pessoas cuidam muito bem de suas calçadas. Caminhar é o jeito mais fácil e o único possível de se conhecer o que uma cidade pode oferecer.

Meli Malatesta, que preside a Comissão Técnica de Mobilidade a Pé e Acessibilidade da ANTP (Associação Nacional de Transportes Públicos), afirma que a estrutura urbana que dá apoio à forma de mobilidade mais natural que existe nunca teve o destaque, a importância e a porção de investimento público que merece. O dinheiro público é investido muito mais para privilegiar a infraestrutura para o carro circular, do que os espaços para as pessoas caminharem.

Basta olhar o que é feito nas calçadas das cidades brasileiras. Para facilitar o acesso dos veículos às garagens, as pessoas tornam as calçadas um prolongamento de suas casas. Alteram a inclinação, colocam degraus, invadem um espaço que é do pedestre para melhorar a vida de um veículo. A foto acima, colhida de uma entrevista que Meli Malatesta concedeu á Revista Trip, ilustra bem isso.

Enquanto isso o Estatuto do Pedestre, sancionado com alguns vetos pelo prefeito Doria, precisa ainda ser regulamentado. O prazo é de 90 dias.